domingo, 9 de setembro de 2012

E=m.c²


Você está no abismo da não comunicação. Você tem de correr e saltar, depois se abaixar e tentar esquivar da bala. O projétil vem retilíneo certeiro sem vacilar na sua direção, a zilhões de quilômetros por hora, com outros zilhares de kilowatts força pra te derrubar. Você sabe de algumas coisas. Você estudou, mas por hora tudo cai por terra e é preciso só correr, com força, com todas elas. Você quer mais é que o mundo se exploda agora, com todas aquelas pessoas dentro dele. Crianças, velhos, mulheres, homens. Você está pouco se lixando para aqueles povos passando fome na áfrica. Para aquelas guerras imbecis. Pouco se lixando se homens radioativos vão comer a carne de outros homens radioativos. Se deus existe mesmo. Se deus existe mesmo ele tem de se compadecer da sua situação atual e interceder. fazer o maldito balístico metálico, solido e pesado não te acertar. Meu deus. Você pensa. E continua a correr sem parar. E pensa ainda, por quê? Por que você está correndo que nem louco por sua vida? Os incontáveis milésimos de segundo se esvaem enquanto você lembra. Lembra de montes de coisas que não vão te ajudar agora. Coisas como quando você estava parado na chuva e ganhou o beijo mais vivo daquela garota linda de olhos verdes. Ela era como um anjo. Coisas como quando você fez um dos seus melhores amigos chorar escarnecendo a imagem da mãe dele. Você se arrependeu de ter dito aquilo. Coisas como quando você atravessava a piscina por baixo d'água sem respirar e sentia seus pulmões contraindo. Aquilo era o Maximo. Coisas demais. Então você sente e é como um soco centralizado. Bem na espinha. Não dói como você pensaria que iria doer, mas ainda assim dói. O baque é forte e faz você saltar e tropeçar e cair pra frente. Você ainda está vendo as lembranças passarem na velocidade da luz por seus olhos quando sente mais uma vez. Só que agora é mais forte. Dói, dói muito. Pega você desprevenido. Sua pequena Hiroshima particular. Você firma o maxilar e os seus molares superiores forçam os inferiores, tenta aguentar firme. Você conclui que não deve ter muito mais tempo, então decide olhar pra ver quem te venceu, quem te subjulgou. Não é ninguém, é qualquer um. Um idiota como você. Nem alto nem baixo, nem bonito nem feio, nem preto nem branco nem pardo. Um filha da puta qualquer. É assim que vai ser? É. É assim que é e foi.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Uma mentira


Às vezes é difícil perceber uma mentira bem contada. Principalmente quando além de bem contada a enchem de termos técnicos bem estruturados. Se vê muito disso por aqui. Geralmente é assim, ou se não é, arrumam um modo de ser e de colocá-las lá. Muito bem encaixadas e firmes. Umas entre as outras. Tinta fresca de secagem rápida. Preta e forte. É assim que são.
Me meto com elas e estou aprendendo. Aprendendo a percebê-las. Devo aprender também como criá-las, como copiá-las e reutilizá-las. Mexer com suas faculdades.
Vamo ver no que isso vai dar.
Mais um mentiroso andando por ai. Tudo bem, pra mim. Se for somente por mentir. Já são tantos não é? A gente sabe, mentimos o tempo todo mesmo, e foda-se. Mentimos pras nossas mães quando éramos pequenos demais pra enfrentá-las. Mentimos pras nossas namoradas para que elas não nos matem enquanto dormimos. Mentimos pros nossos chefes para não perdermos nossos empregos. Mentimos pra nós mesmos. Mentimos até pra Deus, se é que se pode mentir pra isso. O tempo todo.
E fodam-se aqueles que acreditarem. Toda honestidade cega deve ser e será castigada. Não podemos nos dar o luxo de sermos ingênuos ao ponto de acreditar no que nos é deliberadamente jogado. É preciso entender o verdadeiro sentido das coisas. O que se passa na cabeça dos mentirosos. Da sua mãe. Da sua namorada. Do seu chefe. Do cara do quiosque. Do outro ali parado na esquina... 
São todos uns mentirosos desgraçados. Eles estão aos montes por ai, fazendo tudo girar. Grupos e mais grupos, facções organizadas, o governo, a porra TODA! Quem eles pensam que são?

É, não vou deixar que me enrolem facilmente. Eles vão ver. Ah, se vão.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

O Penitente

Você é luxúria, lascívia exalando nos olhos, salivando no peito macio e doce;

Você é sexo, com força, repetidas vezes... Muito bem feito;

Você é perdedor, sempre foi e por isso luta, luta e continua lutando, vence pelo cansaço, mas sabe que continua perdedor;

Você é raiva, não ódio, mas raiva desmedida, desproporcional e inconveniente;

Você tem tudo, tem tudo para não ser o que é, porém prefere assim continuar para não deixá-lo de ser;

Você tem medo, tem medo do que poderia conquistar pondo a perder o quinhão que já tem;

Você é inveja, inveja de si mesmo;

Você é fome, fome de ser você;

Você também sou eu...

E eu também sou você.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Propósito cadáver

Algo morreu.

A sede da vitoria já não mais perturba o sono.

Esqueci como me dizer o quão maior e melhor sou do que outros demais.

Objetivos e anseios não existem, se é que algum dia existiram.

A fome de tudo cessou.

Nada brilha nos olhos.

Dores de perda indeferem.

Êxtases de triunfo não completam, não satisfazem.

O tempo dos dias é engolido a seco.

Lagrimas escassearam e embriagam, e me banham em águas estáticas, salgadas, cinzas e turvas.

O que percorria veias e fazia membros erguerem-se sumiu.

O grito rouco e desesperado da alma perdida no profundo escuro da carne é tão fraco que não se faz escutar.

Não recordo se o fim está por vir ou se já passou.

Sou inerte reflexo vitrificado em admirável descoberta da não significância, vislumbrando prova de existência impotente.

De inicio inacabado e fim permanente.

domingo, 25 de abril de 2010

O Idiota no Escafandro

Podia ficar muito tempo nessa de ignorar o peso da alma e passar a vida parado, estagnado, muito bem mais ou menos acomodado neste furacão de coisa alguma sem a ter a mínima vontade de buscar uma maneira de mudar. Partindo do pressuposto de que nossas ações repercutem no espaço e no tempo, tudo é efêmero e hedônico, enquanto a beleza do por-do-sol ilumina tanto a cabeça cortada numa guilhotina quanto o desabrochar da borboleta partindo o escafandro. Logo vem vindo mais uma colisão de planetas e novamente serei eu o batizado pelo fogo destes em repercutida eclosão. Agora nasce mais um príncipe detentor universal da arte de roubar palavras nunca antes proferidas, cá estou eu, mais um idiota cego há tentar burlar a escuridão do próprio buraco negro, mais um idiota num escafandro...

Bluesmen

Eu não sou um bom mentiroso, alguns dos meus amigos sabem disso. E não me importa o que você faz, não me importa o que você diz, também não me importa aonde vai ou quanto tempo ficará. Mas realmente amigo, o que eu queria de verdade é que meu Blues te beijasse como um primeiro beijo apaixonado de duas crianças, queira que a harmonia dos meus acordes te pegasse de jeito, queria ver a melodia de minhas cordas penetrando bem fundo na sua alma... Então aí, mas só aí, queria que nossos olhos se encontrassem e neste instante estaríamos sorrindo sinceramente como fariam dois irmãos.



terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Morto Amor



Era um homem bem apessoado, de meia idade, tinha por volta dos seus trinta e poucos, de semblante sério, talvez adquirido em razão de seus muitos anos de farda, era militar; de olhar penetrante e testa larga, mostrava-se sempre de acordo com o que se entende socialmente por ético e direito. Cultivava com certa vaidade um bigode fino, milimetricamente bem talhado, herdado de seu pai ao qual inconfessadamente nutria ainda grande apreço. Dias atras tinha-o perdido, o seu pai, em razão de um antigo câncer de pulmão. Homem de caráter firme e rigidez ideológica, lembrava.
O evento era o velório deste, lá estavam só alguns poucos familiares, sua mãe já morrera a muito e por ser filho único então chamou apenas amigos mais próximos, algum tio distante e talvez um vizinho. O corpo do velho estava estirado num caixão preto como de costume, coberto por flores brancas e uma bandeira de sua nação, visto ter sido ele também militar em sua mocidade, isso não poderia faltar. Não chorou ao ver seu velho pai lá sem vida a dormir o sono sem fim, isso mais lhe deu algum tipo estranho de satisfação, parecia que até tinha uma ponta de alívio no fundo da alma, entretanto, não deixou transparecer tal inconveniente emoção a qualquer convidado da fúnebre cerimônia. Não sabia bem o porquê, mas relembrou seus tempos de menino quando seu pai o repreendia à palmatória sempre que o encontrava fazendo algum tipo de idiotice infantil.
Dias seguintes, se seguiu o enterro, fez questão de gastar mais um pouco de umas economias que guardara para outro luxo qualquer e comprou um "mausoléu razoável" para seu pai morto. Sentiu-se obrigado a fazê-lo por ainda ver-se na necessidade de honrar com a memória correcta que deixou permeada em sua lembrança. Não podia deixar isso passar em branco, o seu velho pai deveria dormir para sempre em um aposento decente, pensou consigo mesmo. Talvez desejasse vir visitá-lo algumas vezes e não queria ver apenas um pedaço grosso de pedra riscado no chão.
Na semana seguinte não conseguiu dormir direito, sempre que deitava a cabeça no travesseiro remotas memórias o tempestuavam o sono; eram flashes de sua infância onde seu pai sempre o consolava e afagava entre os seus braços.
Sonhava com tais memórias, lá estava sempre o seu pai presente, cuidando e dando-lhe calor paternal. Passou a semana seguinte com vontade de ir vê-lo.
Os lapsos de memória passaram a ser mais freqüentes, todas as vezes que se encontrava a devanear estava a lembrar das conversas com o seu pai, pegou-se umas vezes a deixar cair singelas lágrimas ao lembrar com um pouco mais de clareza dessas conversas cheias de amor que tinham. O mais estranho era que parecia ter se esquecido de tais lembranças, e com a repentina morte de alguma forma elas voltaram à tona. Agora as lembranças que tinha de seu pai não eram somente aquelas em que ele se sentia repreendido ou de cega obediência disciplinada, eram de forte amor e compadecência mescladas com carinho e amizade. No primeiro domingo depois do enterro foi visitar o pai no cemitério. Não era de seu costume ir para tal local em razão de nunca ter tido nem um parente próximo morto, mas lá estava, e com inflamada vontade de ver seu velho pai para dar-lhe mais um ultimo adeus. O mausoléu era grande, de pedras de mármore azul escuro, bastante imponente, uma minúscula capela na verdade.
Lá dentro se encontrou de frente para o caixão do seu tão amado patriarca. Neste instante sentiu o peso do fato de não poder nunca mais tê-lo consigo ao lado, de poder abraçá-lo, de chorar seus medos de criança nos seus braços e ter mais uma ultima vez uma daquelas tão amáveis conversas de pai e filho que lembrava incessantemente. Então, tomado por uma forte vontade de sentir mais uma vez o afago da mão amiga do pai resolveu abrir o caixão. Tirou as trancas que o fechavam, com o rosto em prantos, respirou fundo e abriu-o.
Lá estava o corpo de seu velho pai, morto, sem vida, com a pele cadavericamente enrugada e desprovida de cor, de aparência já quase repugnante. Quando o viu naquele macabro estado pôi-se de joelhos na sua frente, baixou a cabeça sobre o peito de seu cadáver e deixou as lagrima molharem seu rosto e escorrem até o negro terno do pai morto. Chorava e apertava forte sua fina mão sem mais nenhum pulso vital, tinha plena certeza de que poderia ter sido um filho melhor, talvez dado mais atenção quando estava na ultima velhice, queria recompensá-lo de alguma forma, mas já era tarde. O seu querido pai estava morto a sua frente e nada poderia mudar tal fardo.
Esse sentimento de arrependimento o fez querer abraçá-lo, beijá-lo no rosto como quando fazia na época de menino. Pois não se conteve e o fez, estava quase que em cima do corpo do pai a abraçá-lo, a beijá-lo no rosto. Olhava para os olhos fechados dele que estavam bem ali na sua frente, parecia que podia sentir seu cheiro e não o do impregnante formol que se alojava naquele sinistro mausoléu.
Beijou-o na boca, não sabia bem o que estava fazendo, mas agora que seus lábios quentes tocavam os dele frios tudo fazia sentido.
Passou a exictar-se de tal forma como nunca antes havia acontecido, estava em cima do caixão do morto velho pai a amá-lo como um homem ama uma mulher. Pôi-se a despir-se de todo, não pensava no que fazia, apenas fazia. Já nu puxou a ossuda mão do pai morto para seu genital e o fez masturbar-lhe freneticamente, sentia um prazer abissal no bizarro ato que estava concretizando.
Montou o cadáver do pai, arriou-lhe as roupas de baixo e inesperadamente tentava penetrá-lo. Quando finalmente conseguiu violá-lo introduzindo o pênis dentro do reto estava em total tranze sexual, acometeu-se de um prazer quase que divino de estar ali, dentro de seu pai morto, a ejacular.
Quando terminou o que fizera parecia que tinha realizado o ato mais grandioso da sua vida, notou-se numa plenitude tal qual a de ter gerado um novo ser. Era agora um homem realizado. Nos anos que se passaram, assiduamente, tornou a visitar o pai, encontrou no ato de fazer amor com o seu cadáver o sentido supremo de sua vida. Amava-o morto e morto amava-o.